domingo, 31 de agosto de 2014

Impressões: Frankenstein, de Mary Shelley


O livro de hoje é um clássico da literatura de terror, que admito não estar nas minhas listas de leitura até pouco tempo atrás, mas minha atenção foi conquistada após ouvir um PODCAST SOBRE A OBRA. O livro tem um ar muito mais romântico do que normalmente se pode esperar de um livro de terror, e especificamente sobre o Monstro (conhecido na cultura pop como Frankenstein) difere bastante do gigante abobalhado com parafusos no pescoço que normalmente se vê por aí.


A história começa com uma troca de cartas entre dois irmãos, Margaret e Walton, durante uma viagem deste nas regiões gélidas do ártico. Após algumas cartas, Walton descobre Victor Frankenstein desolado no meio do gelo, em situação de saúde lastimável. O homem é resgatado e, após se recuperar, conta seu passado, desde um jovem apaixonado pelas ciências naturais até os dias de tormenta que passou depois de ter criado o horrendo Monstro, ato que se torna eterna fonte de arrependimento e agonia desde que ouviu o primeiro urro da sua criação. Embora a história foque o passado de Victor, acabamos tomando conhecimento sobre os rumos tomados pelo Monstro, e descobrimos que ele é - se torna, na verdade - um ser pensante, eloquente e bastante razoável; entretanto sua aparência horrenda o condenou viver em sofrimento e solidão.

É importante destacar o peso que a aparência tem na tragédia do Monstro e como isso gerou toda a sequência de infortúnios. O medo de alguém que é jogado numa cela com um leão provém da impotência diante da fera, diferentemente do medo de alguém que é jogado na mesma cela tomada por baratas. O Monstro podia instilar os dois tipos de medo, porém fica claro que a repulsa que sentem por ele é tão somente graças à sua aparência nojenta, ao passo que em certo momento da história, o Monstro é acolhido por uma única pessoa: um cego. Análogo à essas duas formas, Victor era assombrado por um terceiro e mais opressivo terror: o de ter condenado a humanidade à viver sob a ameaça do Monstro.

Raiva, tristeza e ocasional esperança são os traços mais fortes que senti na leitura, e todos esses sentimentos são apresentados tanto em Victor quanto no Monstro, por diferentes razões. A escrita é bastante poética, deixando o texto denso em sua maior parte e dando um ar de teatralidade às cenas. Muitos atribuem um aspecto religioso muito presente no livro, o que não me marcou tanto assim. Talvez por eu ter lido a edição de 1831, ao invés da original de 1818, algumas coisas tenham ficado de fora, mas pelo que percebi, a presença da religiosidade se dá em instâncias normais de livros clássicos - especialmente de terror - que já não é tão fácil de se implementar devido ao materialismo científico que vivemos hoje em dia.

O que gostei:
- A escrita quase teatral, ainda que três ou quatro vezes eu tenha me distraído nas divagações melodramáticas.
- Cenas bem montadas.
- Personagens convincentes e bem definidos.

O que não gostei:
- No final da história eu estava ávido para descobrir o desfecho e tinha que aturar pela enésima vez as lamúrias de Victor. Ainda que a escrita fosse boa e coesa com as passagens anteriores, eu me peguei desejando pular as ponderações tristonhas dele para continuar com os fatos seguintes.

Considerações finais:
Frankenstein foi uma experiência gostosa de se ler. Não vai dar susto em ninguém e a escrita refinada talvez diminua o terror do enredo para valorizar a tragédia vivida pelos personagens, mas ainda assim, um dos melhores materiais de terror que já li (lembrando que nunca fui entusiasta do gênero). Ironicamente eu li uma edição em inglês (não tive problema algum com o entendimento, ainda que muitas palavras e construções de época me soassem estranhas) e no livro há referência ao fato de que só aprendendo outras línguas e lendo seus autores, alguém pode se considerar verdadeiramente letrado.



2 comentários:

  1. O Victor enche um pouco a paciência, o que é bastante compreensível pelo estilo literário da época, mas ainda assim cansa.

    Engraçado como o "horror" é mais um drama cercado de perdas trágicas do que o que a gente considera hoje em dia como "horror" com medo, violência, etc.

    Mas repare que a variação no inglês da época é bem pequena em relação ao português da mesma época. Engraçado como a nossa língua muda mais.

    De todo modo impressiona como a autora tem fluência na escrita, sobretudo na história do monstro que - pra mim - a melhor parte do livro!

    Que bom que gostou da dica! Abs!

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  2. Valeu pelo coment, Igor!
    Sobre a variação da língua, é verdade. Eu só percebi mudanças bruscas no inglês nas sentenças longas (que às vezes se reposicionavam de um jeito estranho) e nos pronomes.
    Abs.

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