segunda-feira, 8 de junho de 2015

Impressões: O castelo das águias, de Ana Lúcia Merege


Fechando a minha lista de leitura do primeiro semestre, O castelo das águias, da autora Ana Lúcia Merege, a mesma que cansei de elogiar nos comentários sobre contos da Draco e Trasgo. Finalmente passei para a seção de romances da autora, que já tem um bom número de publicações, mas não precisei deixar o mundo de Athelgard, cenário desta e das demais histórias resenhadas aqui. Antes da sinopse e da resenha, quero frisar uma coisa: não costumo comentar sobre pesquisa e referências nas obras, e não será diferente aqui neste post, porém, para quem gosta de se aprofundar nas leituras favoritas, Ana Lúcia Merege oferece um oceano de informações para seus leitores no BLOG DO LIVRO.
Então, finalmente, vamos à minha análise:


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O Castelo das Águias, romance fantástico de Ana Lúcia Merege, é um lugar especial. Localizado nas Terras Férteis de Athelgard, região habitada por homens e elfos, abriga uma surpreendente Escola de Magia, onde os aprendizes devem se iniciar nas artes dos bardos e dos saltimbancos antes de qualquer encanto ou ritual.
Apesar de sua juventude, Anna de Bryke aceita o desafio de se tornar a nova Mestra de Sagas do Castelo. Aprende os princípios da Magia da Forma e do Pensamento e tem a oportunidade de conhecer pessoas como o idealizador da Escola, Mestre Camdell; Urien, o professor de Música; Lara, uma maga frágil e enigmática, e o austero Kieran de Scyllix, o guardião das águias que mantêm um forte elo místico com os moradores do Castelo.
Enquanto se habitua à nova vida e descobre em Kieran um poço de sentimentos confusos e turbulentos, uma exigência do Conselho de Guerra das Terras Férteis põe em risco a vida e a liberdade das águias. Com o apoio de Kieran, Anna lutará para preservá-las, desvendando uma trama de conspiração e segredos que envolvem importantes magos do Castelo.

Sim, o cenário é uma escola de magia, mas qualquer sentimento que possa ser evocado a partir desta informação deve ser abrandado e posto de lado, porque a história de Anna é completamente diferente da do bruxinho inglês que todos conhecem, e ainda bem! Se há duas coisas que eu preciso observar logo de cara sobre OCDA é a originalidade e principalmente a consciência da autora no que se pôs a fazer. A história não retrata um protagonista "escolhido" por forças superiores, muito pelo contrário, conta um enredo completamente natural, se valendo para isso de um encadeamento de cenas e situações corriqueiras, definitivamente um  slice of life, que ultimamente só vejo existir com força como gênero de animação japonesa. Assim que me dei conta deste viés, eu já estava convencido da ótima qualidade do texto, mas passei a taxá-lo de não-comercial. Mas, à medida que a história fluía, percebi o quão eu estava errado, por conta de pura alienação. A história é tão diversa dos demais romances de fantasia que vemos por aí, que acabei julgando mal, e mais para frente na minha leitura me dei conta de que a trama de OCDA vai além de qualquer alcance de romance de fantasia, pois gera identificação com o muito mais amplo grupo leitor de ficção realista. Há, sim, magia na história, os leitores de fantasia não precisam se preocupar, mas a autora extrapola as convenções e torna Athelgard um lugar comum também para o público não acostumado, pela utilização mais naturalista dos conceitos mágicos, assemelhando-os bastante com o que existe na vida real: simpatias, superstições, fé e expressão emocional pela arte. Esqueça poderes mágicos e feitiçaria, a magia de Athelgard é uma hipérbole da magia do mundo real! Esse fator, sozinho, me conquistou por completo, é um recurso muito raro hoje em dia, mas que aprovo como escritor e me senti maravilhado de encontrar num texto da Ana Lúcia, a qual já vem sendo alvo de meus elogios há algumas resenhas.

A escrita da autora é simples e flui de uma maneira excepcional, o que eu já vinha reparando pelos contos que li, mas vale o lembrete de que o romance - em especial um de fantasia - permite a prolixidade, principalmente nas descrições. Apesar de me identificar com o estilo, a demanda do leitor típico de fantasia é clara quanto a isso, e às vezes rodeios que elaboram são mais elogiados que passagens curtas de construção mais rica. E esse último não falta na obra, a autora nunca decepciona em usar de vocabulário e construção frasal permeados de relevo, que exprimem com assertividade as passagens narradas. Sendo um livro direcionado para o público juvenil, deixando de segmentar o leitor como acostumado à fantasia, a linguagem utilizada é ideal.

Agora os altos e baixos mais discrepantes no livro: as personagens. São muitas, variadas e carregam cada uma seu nome e função, mesmo que sua participação na trama seja irrisória. Por um lado, isto agrega vida ao mundo imaginário e dá a sensação de inteireza além do que é mostrado no enredo principal; por outro, fica muito vago ter tantos personagens que não são marcantes e/ou não possuem tanta relevância na trama. Novamente, eu me identifiquei com o tipo de construção, porém a dificuldade existia, isso não posso negar. Confirmando a impressão que tive anteriormente lendo contos, a autora realmente gosta de apresentar personagens em grupo, e isso trouxe alguns problemas na definição das personagens. Como as descrições não são profundas, a tendência é não dar muita atenção quando um grupo de alunos, por exemplo, é apresentado, só que mais para frente o leitor descobre que um ou dois daqueles são mais importantes para a trama, enquanto os outros não, mas já é tarde para lembrar das características de cada um, faltou um reforço na caracterização. A minha solução foi a mesma que usei ao ler O Nevoeiro (Stephen King) - pois ele só usou adultos caucasianos de meia idade no seu romance, impossibilitando a memorização das personagens - eu memorizei as personagens principais (Anna, Kieran e mais alguns), e as secundárias e terciárias agrupei como burocratas/alunos/magos, e apenas incutia a imagem de cada categoria a uma personagem quando aparecia, sem realmente visualizar mentalmente os indivíduos com suas características próprias. A quantidade de pessoas no livro é ótima, a complementação de mundo que proporcionam é mais importante que a participação reduzida (se não fosse, tais personagens seriam inúteis), porém faltou algum tipo de reforço para ajudar a fixar cada pessoa a uma figura correspondente.

Apontadas as observações acima, fica registrado que O castelo das águias falou comigo de uma maneira como pouquíssimos livros fizeram; se bem me lembro, apenas Notas do Subsolo, HP e o Cálice de fogo e alguns contos de HP Lovecraft me afetaram de forma semelhante. É possível que seja o livro que li mais rápido em toda a vida, e como escritor também me identifiquei bastante com a maneira da Ana Lúcia Merege se expressar pelas letras. Sem ter muito mais a acrescentar, deixo abaixo os pontos resumidos e minhas considerações finais.

O que gostei:
- Toda a estrutura macro da história, sendo um slice of life no meio de tantas publicações de fantasia recauchutada
- A escrita é fantástica
- Anna, construída de maneira magnífica pela narração em primeira pessoa, com conflitos interessantes e coerentes
- Construção geográfica de Athelgard
- Interação dos grupos sociais; mesmo diferentes entre si, a caracterização foi realista e sem caricaturas
- O clima de conto de fadas, que torna o castelo um lugar seguro para o leitor como é para Anna

O que não gostei:
- Dificuldade para memorizar personagens importantes

Considerações finais:
O castelo das águias é um livro que começa de uma maneira simples, e assim segue até o fim; como na vida, são as pequenas coisas que nos cativam e nos fazem pegar de novo o livro para ver o que vem adiante na vida da Mestra de Sagas, e quanto mais o leitor se impressiona com a narração da protagonista, mais ele se dá conta que, apesar do que diz a história, a verdadeira Mestra de Sagas não é Anna de Bryke, é a Ana Lúcia Merege.







Um comentário:

  1. Muito obrigada, Coelho! Seus comentários provam que estou no caminho certo.

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